Consumo consciente: uma ferramenta tão poderosa quanto o voto
- Igor Ferreira
- Apr 3, 2023
- 3 min read
Somos ensinados que, para escolher o melhor produto ou serviço na hora de consumir alguma coisa, devemos olhar acima de tudo qual é o melhor preço. Podemos considerar também outros fatores, como a qualidade e a durabilidade, com um raciocínio um pouco mais complexo de custo-benefício. Ainda assim, a ideia é obter um certo grau de satisfação de nossos desejos e necessidades gastando o mínimo possível.
Acima de qualquer outra coisa, um cálculo econômico define a escolha. Afinal de contas, é isso que as pessoas fazem quando são racionais. Ou pelo menos é isso o que sempre nos dizem sobre a forma como as pessoas se comportam quando são racionais. Mas será que os fatores econômicos são mesmo os aspectos mais importantes a serem considerados na hora de consumir?
Não existe resposta certa para essa pergunta. No entanto, certamente existem outros fatores – muito além da tradicional análise custo-benefício – que podem ser considerados por indivíduos racionais. As vantagens e desvantagens de consumir um produto ou serviço não necessariamente são econômicas e nem precisam se resumir aos ganhos e perdas individuais. Podemos considerar, também racionalmente, as vantagens e desvantagens sociais, ambientais e políticas, pois tudo o que afeta a sociedade e o ambiente no qual vivemos acaba nos afetando no fim das contas. A partir dessa ideia surge a prática do consumo consciente.
Isso significa que, na hora de escolher qual produto ou serviço consumir, você pode analisar também se aquele produto ou serviço (ou quem o oferece) está alinhado aos seus valores e efetivamente contribui para materializar sua concepção de sociedade ideal. Se você dá importância à proteção ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável, prefira produtos e serviços cujo ciclo de produção, consumo e descarte não cause muitos males à natureza. Se você apoia mercados competitivos e o livre comércio, dê preferência aos pequenos comerciantes locais em vez de comprar em grandes redes. Se você defende a democracia, evite marcas associadas a candidatos políticos autoritários e privilegie marcas associadas àqueles mais compatíveis com as suas ideias.
Mas por que seria importante levar esses outros fatores em consideração, mesmo quando parece tão mais simples e confortável considerar apenas o custo-benefício? Como o nosso consumo pode efetivamente gerar vantagens e desvantagens sociais, ambientais e políticas? Em outras palavras, por que podemos dizer que o consumo consciente também é uma forma de consumo racional?
A resposta a todas essas perguntas passa pelo poder do dinheiro em nossa sociedade. Afinal, em uma sociedade capitalista, é por meio do dinheiro que as coisas acontecem. Se alguém quer sustentar uma ação por muito tempo, dar amplo alcance a uma iniciativa ou fazer uma ideia crescer em escala, precisa de dinheiro. Sem grana, as pessoas, empreendimentos, ideias e atitudes não prosperam – pior, não sobrevivem. E ao escolher qual produto ou serviço você quer consumir, você está escolhendo para onde vai a sua grana. Na prática, você está escolhendo (seja qual for o critério da sua compra, ainda que você se abstenha de pensar nos eventuais ganhos e perdas sociais, ambientais e políticos e pense apenas no custo-benefício) quais pessoas, empreendimentos, ideias e atitudes terão acesso ao seu dinheiro e, portanto, uma chance maior de prosperar.
Por isso, o seu consumo é uma ferramenta de transformação social e de cidadania. Assim como o seu voto nas eleições, é uma forma de escolher quais causas você quer ou não quer apoiar. Você pode muito bem se abster de escolher, simplesmente dizer “tanto faz” e fazer suas compras apenas com base no custo-benefício – e isso é perfeitamente racional, como também é racional o eleitor que abdica da escolha e vota nulo nas eleições. No entanto, enquanto viver em uma sociedade capitalista e ocupar a posição de consumidor, você não pode se desvencilhar desse poder. Sempre estará em suas mãos optar pelo consumo consciente. Sempre estará com você essa poderosa ferramenta para transformar a sociedade, aproximando-a um pouquinho mais daquilo que você acredita ser a sociedade perfeita. Use-a – ou não use-a – como achar melhor.

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