Não devemos evitar o erro
- Igor Ferreira
- Sep 23, 2018
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Igor Ferreira
Desde que nascemos, somos ensinados a evitar o erro. Mais do que isso, ensinam-nos a temer o erro. Errar é inadmissível, é o pior que podemos fazer. Nas escolas e universidades, somos cotidianamente submetidos a provas cujo objetivo é, principalmente, punir o erro para extirpá-lo, pouco a pouco aniquilar sua existência. No trabalho, um erro pode significar uma demissão. Mais recentemente, nos ofícios mais diversos, passamos inclusive a substituir os seres humanos por máquinas, afinal acreditamos que a máquina nunca erra (não seria essa crença, em si, um erro?)
Mas afinal, o que é um erro? A existência do errado pressupõe a existência do certo. O erro é o desvio, é tudo aquilo que se encontra fora desse certo. Mas o certo sempre depende do contexto. É fácil encontrar exemplos que comprovem a influência do contexto na definição do certo e do errado, seja no estudo das culturas, da física ou até mesmo da matemática, a disciplina na qual costumamos ter mais certezas.
No ramo das culturas, um flagrante exemplo é o diferente tratamento da poligamia nas sociedades muçulmanas e cristãs. Em países islâmicos o casamento de um homem com duas, três ou até quatro mulheres é tido como certo. Mais do que isso, é uma prática comum, socialmente aceita sem maiores controvérsias. Já nas nações de maioria cristã, costuma-se criminalizar a mesma prática. Entende-se que a poligamia é errada, por isso possuir mais de uma mulher – ou mais de um marido – é uma excelente forma de garantir seu lugar na cadeia. Outros evidentes exemplos se referem às diferentes visões, em distintas culturas, sobre o casamento homossexual, o aborto e o uso recreativo de drogas.
Na física, não é necessário sequer entrar no ramo da física quântica (a qual colocou em xeque a maior parte das certezas da física tradicional) para compreender que o certo depende do contexto. Posso dizer, por exemplo, que nesse momento estou parado em frente ao meu computador escrevendo este texto. Diante de um observador na mesma sala, realmente estou parado e, portanto, a afirmação está certa. Por outro lado, se o ponto de referência deixa de ser meu observador na mesma sala e passa a ser o Sol, a afirmação está completamente errada. Estou me movimentando, inclusive, de forma bem veloz (para ser mais preciso, cerca de 1700 km/h se considerarmos o movimento de rotação da Terra e, em média, 107.300 km/h quanto ao movimento de translação).
Na matemática, pode-se dizer que o único número entre 1 e 3 é o número 2. Essa afirmativa está correta se considerarmos o conjunto dos números naturais ou, ainda, o dos números inteiros. Por outro lado, está claramente errada se considerarmos o conjunto dos números racionais, ou mesmo o conjunto dos números reais (sequer precisamos envolver, neste exemplo, os números imaginários).
Se o certo depende do contexto e o erro é o desvio com relação ao certo, errar não é nada mais que estar fora de contexto. Será que realmente devemos, então, nos preocupar tanto com o erro? Será que estar fora de contexto, isto é, errar, nos traz apenas consequências negativas? Nossa experiência histórica parece responder que não. Dessa vez, um exemplo emblemático pode ser retirado da biologia. Trata-se da descoberta dos antibióticos à base de penicilina, mero acidente que nos ajudou a curar tantas doenças.
Demonizar o erro, ressaltando somente suas consequências negativas, é se esquecer que o erro é o primeiro passo para a inovação. Inserir algo em um contexto ao qual não pertence é, muitas vezes, descobrir o novo. Errar é descobrir a aplicabilidade de uma coisa onde antes essa coisa não era aplicável. Errar é mudar a disposição das coisas no mundo. Errar é criar.
Por fim, errar é, também, aprender. Ainda que inserir a coisa em um novo contexto não dê os bons resultados esperados, errar é a melhor maneira de se conhecer os resultados ruins e, em outras oportunidades, evitá-los. Errar é inerente a quem faz, a quem age, a quem pratica algo. Não agir por medo de errar é deixar de viver. Portanto, erremos, e que tenhamos uma nova atitude frente ao (injustamente) tão malvisto erro.
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