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O Carnaval de BH e a captura dos movimentos populares



Foto: Bitar e Paiva. Disponível na página oficial do bloco 'Então, Brilha!' no Facebook.

Igor Ferreira


A cidade de Belo Horizonte não era famosa por seu Carnaval. Seus habitantes geralmente aproveitavam o feriado para viajar, seja para festejar em outros lugares (como Salvador, Rio de Janeiro, Ouro Preto e Diamantina), seja para descansar no interior ou na praia. Assim, sobrava apenas uma cidade deserta, com ruas vazias e pontos comerciais fechados ou sem movimento.


Essa situação começou a mudar por volta de 2013, quando surgiu das ruas a iniciativa de transformar o Carnaval belorizontino em uma grande festa. Se por um lado a folia que acontece no feriado já tem, em outros lugares, um certo caráter popular, por outro lado esse aspecto era muito mais evidente no movimento iniciado em Belo Horizonte. Na capital mineira, foram os blocos de rua gratuitos e autofinanciados que impulsionaram a festa. Mais ainda, o Carnaval de BH cresceu como um movimento de protesto contra o modo de conduzir a cidade adotado pelo então prefeito Márcio Lacerda (empresário que costumava privilegiar a própria classe nos atos de seu governo, prejudicando os habitantes mais pobres da cidade, além de proibir e reprimir festas populares organizadas espontaneamente).


Por oferecer uma alternativa boa e muito mais barata do que as viagens para outros lugares, o Carnaval organizado pelos blocos de rua em BH cresceu e se tornou um dos maiores do país. Em um intervalo de cinco anos, a capital mineira passou de cidade fantasma a um dos destinos turísticos mais procurados durante o feriado. De repente, a festa que raramente reunia dezenas de milhares de pessoas passou a contar com 4,3 milhões de foliões.[1]


Porém, o sucesso acabou tendo um preço (muito mais alto do que a inevitável dificuldade de circular e de encontrar seus amigos nos blocos superlotados). De certa forma, a festa da multidão belorizontina foi capturada pelo governo (especialmente pela Prefeitura de Belo Horizonte) e pelo capital. Embora os protagonistas da folia continuem sendo os blocos de rua, a organização passou a ser realizada pela Prefeitura, a quem cabe agora impor uma série de restrições e recolher os louros do sucesso.


Ao mesmo tempo, grandes empresas passaram a patrocinar as festividades. O dinheiro e os recursos oferecidos no patrocínio não se destinam aos idealizadores e demais membros dos blocos de rua, mas sim à Prefeitura – que repassa menos da metade de seus lucros aos verdadeiros responsáveis pelo sucesso do Carnaval.[2] Em troca, as empresas exigem condições especiais para os seus produtos e associam suas marcas à festa, tentando reescrever a história através da propaganda – como se delas tivesse se originado o crescimento do Carnaval belorizontino.


Evidentemente, a captura não é total: há sempre algo na multidão de foliões que escapa ao domínio da Prefeitura e dos patrocinadores, algum elemento de alegria, de conexão com os companheiros de folia e de espontaneidade (sem o qual o Carnaval de BH não floresceria há alguns anos e nem duraria nos dias atuais). Além disso, a grande maioria dos ambientes de festa no feriado continua sendo de acesso gratuito e universal. Ainda assim, governantes e empresários tentam esconder esse elemento popular do qual não podem se apropriar – embora tal elemento seja a origem dessa grande festa e a força que a mantém viva.


  1. [1] Dados do Carnaval de 2019, conforme texto do portal Bhaz, disponível em https://bhaz.com.br/2020/01/27/prefeitura-gasta-carnaval/ , acesso em 28 de janeiro de 2020. [2] Conforme informações disponíveis na publicação citada anteriormente.

 
 
 

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